sábado, 6 de outubro de 2007

Há muito tempo não te escrevo.

“Alceu, quem tá vivo desaparece sempre. Cá estou novamente.
Ao longo desse tempo estive em muitos lugares, embora a maior parte do tempo tenha passado na frente do computador e no banheiro. Visitei lugares inusitados, conheci pessoas interessantes e outras menos importantes. Para minha felicidade, muitas não me reconheceram; prova que me disfarcei muito bem de mim mesmo. Embarquei à terra das flores, após ter certeza que não me reconheci ao espelho.
Encontrei meu grande amor, Capova, sentada em um pinto preto. Usava um nome falso, que para minha decepção, logo descobri ser verdadeiro para aqueles que a chamavam. Fiquei triste e excitado, e sem mover um músculo da face e por estar pronto, sem perder tempo me candidatei a participar do filme que estava sendo rodado em São Petesburgo. Comemorando100 anos da morte de Trotsky, A Pintada seria lançado na semana do Oscar.
Sim, assisti ao filme na minha viajem que ainda faria à Terra do Nunca.
A experiência como ator me salvou de passar fome por um tempo. Alguns segundos depois, percebi que outra viajem me aguardava, ou, estava guardada para mim - Com o dinheiro dos royalties pelo uso indevido da minha imagem pelado, entrei em uma loja de roupas usadas por mendigos e para esconder minha vergonha, comprei o primeiro fraque azul que encontrei - Era um sábado de outono Aqueles em que o céu, na minha desilusão de ótica , parece ainda mais azul -. Cuidadosamente despedi-me dela; “adeus minha saudosa imagem do cão”. Lançando-a com sua nova roupa ladeira abaixo, fui rezar no centro da Praça da Paz, sentindo-me livre de tamanho peso e sem perceber desafiando (com meu pinto de fora), os chineses com roupa de pelúcia que guardavam um tumulo – ‘como se alguém quisesse roubar o defunto....’
Pois eh Alceu. Eu não estava totalmente livre, e aconteceu de novo. Dessa vez eu estava melhor preparado, exatamente como um egoísta especialista... ajudei vestir, embalar, cuidei da aparência, (paguei o carniceiro que ajudou escolher as flores), tentei vestir a roupa de Urso...é, eu... um ex-rei fazendo o trabalho sujo e recebendo ordens de meia dúzia de otários. Só quem viaja sabe o que significa isso. Mais um presunto se ia, enquanto eu, ladeira acima me ia. Cada um faz sua parte.
Agora vou embora. Mudar para um lugar um pouco mais ao Sul. Morar ao lado de um grande lago que chamam de rio...eu vou sem avisar meu tio que pode ser o próximo da fila, mas aí, não quero estar aqui, para tomar parte na maldita despedida, e fazer minha parte tudo de novo. ‘Vou sair à parte, pois assim como todos que partem, não preciso me despedir nem despir-me da minha ipocrisia de acreditar que todos que estou me despedindo irão me visitar sem avisar, e tomar parte á minha mesa, chamando minha filha de princesa, por saberem que isso me amolece o coração – contrariando as leis que ajudei a construir: Física. Para alguns, ao inferno, e outros ao pinto.
Sim, eu vou. Não quero choro nem vela, pois pretendo voltar para votar no defunto mais bonito... só não quero enterrar ninguém novamente. Você me entende, Alceu?
Há!..e a terra das Flores que descobri ficar perto do porto onde encontrei Capova, após o incêndio, (o mesmo que matou Trotsky, descobri isso agora) varrendo o mesmo chão, com a mesma roupa e vassoura.
Pois eh, reencontrei Korsus (lembra dele ?), mas eu por estar muito bêbado, não nos reconhecemos. Sei que Dominous me viu na travessia, mas tenho certeza que também não me reconheceu. Ah meu Deus...”for the greather good of God”!
E ai Alceu, o que me diz ? Ainda tenho jeito ?
Conheci o prefeito da saudosa maloca. Hahahaha...fumando uma bitoca sentado numa privada; com um computador em punho, ele escrevia um discurso e queria que eu lesse...hahaha... esse aí era o “Ome”. Pena que já morreu, ficou sabendo ?
Passei por pouca e boas, e por muitas e ruins. Tomei álcool, chá, guaraná e fumei capim. Sozinho e sem mim, caminhei pelo Sena procurando o Ayrton, o mesmo que me ajudou a embalar o defunto que quiseram roubar (em minha imaginação imaginando) na praça.
Alceu meu amigo, você deveria viajar mais, sem ligar para as leis que inventei para mim mesmo, mas acabaram descobrindo (todos os idiotas que começam com J´s) que se aplicava a tudo, inclusive aos outros - até mesmo para injeção.
Você deveria viajar sem sair do lugar. Deslocar-se usando a cabeça – não me refiro a uma nova forma de locomover-se utilizando a caixa craniana – Isso... usando a cabeça, por incrível que pareça... ou que suma de vez. Permitir que as sinapses criem novos caminhos no emaranhado de neurônios que você tem entre as orelhas. Pense nisso... e me avise o que acha da idéia.
Por favor, se pensa em me responder, que me retorne antes de morrer, pois como descobri me olhando em muitos espelhos, não tenho a mesma aparência e mais de um e já matei a minha imagem – se demorar, a resposta corre o risco de não encontrar o destino.
Há menino. Eu ainda te ensino, algo.

Saudades,

Seu amigo da onça.
Manassés”

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